segunda-feira, 23 de junho de 2014

[Opinião +D] Meditações hegelianas durante o Mundial

Ainda que não o saibam, todos os comentadores de futebol são, em geral, hegelianos. Encontram (quase) sempre uma “justiça” naquilo que muitas vezes é estruturalmente aleatório, como se de facto o devir da história fosse a expressão da “realização do Espírito”. O devir da história talvez sim, em última instância, mas não, por regra, um jogo de futebol…
Ainda que não de forma hegeliana, mas “socrática”, definido está já o resultado final da contenda socialista. O povo tem, de facto, memória curta e prepara-se, pela mão de António Costa, para ressuscitar o “socratismo”. Não há forma de vencer a onda mediática que se está a criar em torno do ainda Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, de longe o político português com melhor imprensa. Nem o facto de abandonar a governação da capital do país escassos meses após ter sido eleito causa a menor crítica. Outro fosse…
Outra contenda com o resultado já definido é aquela que tem oposto o nosso (Des)Governo ao Tribunal Constitucional. Esta, de resto, é um dos exemplos maiores do estado de negação em que temos vivido nos últimos anos. Anda meio mundo a discutir a constitucionalidade de umas quantas medidas sem discutir a constitucionalidade da sua raiz: será que o Tratado Orçamental assinado por PSD, CSD e PS é constitucional? E o acordo com a Troika? Já para não falar de todo o processo de integração na (Des)União Europeia…
Seja qual for a resposta, o que não se pode pôr em causa é, já se sabe, a nossa Constituição. Todos os regimes têm, de facto, as suas “vacas sagradas”. O Estado Novo, pela voz de António de Oliveira Salazar, “não discutia a Pátria”. O nosso regime, que se diz democrático, proíbe-se de discutir a Constituição – e, “cruzes credo”, de a referendar, o que é decerto um dos absurdos maiores do nosso sistema político –, mesmo que se venha a decretar a inconstitucionalidade da realidade. Aí, parece-me, somos bem pouco hegelianos. Em última instância, a realidade vence sempre. Aí sim, é exactamente como no futebol: “são onze contra onze e no final ganha a Alemanha”.

Renato Epifânio (membro da Coordenação Nacional do +D)

Os textos de opinião aqui publicados, se bem que da autoria de membros dos órgãos do +D, traduzem somente as posições pessoais de quem os assina. 

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